sexta-feira, 31 de dezembro de 2010

Reveillon


Qual é a idade das montanhas?
Dos tempos?
Os relógios são as fezes do tempo.
O Reveillon suas muletas.

terça-feira, 14 de dezembro de 2010

Música da música

Os acordes maiores
São como o ar idiota das flores.

Os acordes menores com sexta,
Se entre si,
Intercalados,
Soam suspense.

Lá e mi,
São bons à toa de dizer.

As diminutas,
De tom e meio e meio e tom,
Se repetem,
Secretamente.

Os acordes
Setimononados
Raiam outros acordes.

A palavra música
É menos musical que
Music.
Já, musical é mais que
Musical.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

terça-feira, 30 de novembro de 2010

Saudade?


Se eles somem
e vão;
nos dessobedecem.
Se se perdem pela mãos.
Desaparecem,
no espelho,
na poeira,
quando nós também insistimos em partir.

Dessa perda,
Fonte e motivo verdadeiro desse descaminho insistente,
desse sempre fazer amigos e amores
que a humanidade vem repetindo desde sempre:
medo da saudade?

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Pecado

“Pecado?!?,
Pecado é roubar e não poder carregar.”
Três corações que eu roubei caíram do balaio.
Sem concerto.

domingo, 14 de novembro de 2010

África

De diarréia e inanição.
De AIDS e solidão,
morre a África.
Morre de colonização.

Em guerra morre a África,
nosso povo pai e irmão.

De Apartheid e ONGs,
morrem os pretos,
da peste negra da fome.
Morrem de minas
de diamante, de explosão.

Em guerra morre a África,
nosso povo pai e irmão.

E é pus que verte
as tetas murchas e quebradas.
É pus,
que desmoraliza os Carpaccios,
os sorrisos,
o sistema de nações.

quinta-feira, 4 de novembro de 2010

Curta-poema-canção Copan 28º


Câmera na testa, Copan 28º. Deitado estático, ventilador ou algo que demonstre estar filmando. 5 segundos, inspiração funda, pigarro. Move a câmera, ficando de pé. Mostra uma agitação de amigos, em volta. Agitados, mas como se não produzissem som. Pego a direita, venho do sofá cinza, corredor, passos. Atravesso a cozinha, esbarro em algo, não ligo: pareço estar apertado. Pau pra fora pela braguilha, jôrro forte. Já olhando a paisagem, do alto, linda e terrível. Suspiro e solto os primeiros saudosos versos do “Frevo número dois de Recife”. Sob a percussão do mijo na água embalo o restante, até o fim. Na volta no corredor silêncio e passos. Os amigos continuam agitados e em off. Volto para posição anterior e vem a Bethânia rasgando o frevo! O Único ruído do mundo é um “Frevo número dois de Recife”. Olho para os amigos, volto para posição. E sobem os créditos.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Sereias e Marujo

1º Ato

Sereias, sirenas
que me olvidaram o caminho,
desorientaram as estrelas.

Tão lindas
Tão serenas e amigas
que levaram meus navios às pedras.

Sereias,
a quem dei anos,
a quem dei filhos.

Sereias todas
Miragem, temor
e ainda não amor.

E não tu,
mulher do horizonte,
porto de minha felicidade.

2º Ato

Marujo infiel,
admites,
reconhece.

As moças que afogaste,
que não eram miragens.

Sem caldas, seus corpos amanheciam nus,
arroxeados,
mortos.

Nas praias,
rolavam tristes na espuma.

Admites,
quando tocava a moça do horizonte,
quando a provava
e ainda se perdia em horizontes,
se despedia.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Preocupem-se

Quantos dias já não enluararam
e você até sorriu.
Quantas noites frias e escuras
já passou em gargalhadas.

Não há o que se preocupar.

Preocupem-se os que não têm inimigos.
Os que bocejam,
enquanto todas as tristezas
vêm nos divertir.

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Um cheiro

Fazia serão no trabalho
Buscava as pendências
Pensava em burlar
De repente passa um cheiro
Que passa pra se olhar.

Um cheiro vestido em vermelho
sumiu pelo corredor.

Perdi o fio da meada do poema.

Ah, mas se ela volta.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Não se mate



Carlos, sossegue, o amor
é isso que você está vendo:
hoje beija, amanhã não beija,
depois de amanhã é domingo
e segunda-feira ninguém sabe
o que será.
Inútil você resistir
ou mesmo suicidar-se.
Não se mate, oh não se mate,
Reserve-se todo para
as bodas que ninguém sabe
quando virão,
se é que virão.
O amor, Carlos, você telúrico,
a noite passou em você,
e os recalques se sublimando,
lá dentro um barulho inefável,
rezas,
vitrolas,
santos que se persignam,
anúncios do melhor sabão,
barulho que ninguém sabe
de quê, praquê.
Entretanto você caminha
melancólico e vertical.
Você é a palmeira, você é o grito
que ninguém ouviu no teatro
e as luzes todas se apagam.
O amor no escuro, não, no claro,
é sempre triste, meu filho, Carlos,
mas não diga nada a ninguém,
ninguém sabe nem saberá.

Carlos Drummond de Andrade

segunda-feira, 18 de outubro de 2010

Suruíal Beat


Perdi-me
Nas vagas ruas
De um qualquer lugar.

Um louco fugido
Abriu a velha porta de um armazém
Onde armazenava seus ancestrais.
Mesmo assim,
Entramos pela janela.
E descobrimos uma tia-avó em comum.

Através dos sonhos dela
Vagueei por de ja vus
Por vagas amarelas, onde
pétalas de algas desconhecidas boiavam
E senti cheiro de esterco em alto mar.
Derivei além de vaguear.

Numa única lambida
Alcancei dos calcanhares à nuca
De uma fêmea linda e morta na qual se transformou o mar revolto
Que reviveu e grunhiu, salgada
Enquanto à engolia num gole.

Sanguíneo,
Caminhei ensolarado pelas sombras
Desenterrei uma ampola de lágrimas
Sob os escombros de uma fábrica de umbrelas.
No Soho, na Istambul, no Lau? No Aleph.
Esvaziei na chuva vermelha de um ocaso de abril.

Sonhei que acordava.

“Finalmente, dei uma caminhada solitária até o dique.
Queria sentar na margem enlameada e
Curtir o rio Mississipi;
Em dez disso,
Tive de contemplá-lo com o nariz encostado numa tela de arame.
Quando começam a separar a pessoas de seus rios,
O que é que nos resta?”

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Turvulência ou melhor poema

Turvas turvas turvas
São a água
Lentos lentos
Oespasços.

Turvulentos?
Turvulentos
São os ventos.

quinta-feira, 30 de setembro de 2010

Outono





Sob minha sombra
Caminho
De dezenas
Centenas
De pequenas
Sombras
Caídas
Da grande sombra
Da árvore.

No tom compartilhado
Mais escuro ou mais claro
Vieses do sol
E do vento
As nossas sombras
Sobre o caminho
Caminhavam.

Sobre a minha
E as demais
Sombras
Tapete voador
Voei uma tarde inteira.

quarta-feira, 29 de setembro de 2010

Um cara que mudou minha vida


Teve um cara que foi meu professor da quinta série ao vestibular. Teve um cara que me disse – e eu na quinta série entendi – que todo o valor vem do trabalho e que o lucro era trabalho roubado. Um cara que orientou minha indignação. Que me apresentou o PT. Que foi com a turma da sétima série para Ouro Preto. Num museu pediu para que encontrássemos a cama onde Tiradentes morreu, nos fazendo sair, em disparada, atrás da tal cama, esquecendo da forca.
Um cara que marcou a mim e aos meus amigos. Eu, mais suscetível, fui fazer história por sua influência. Sou professor por sua influência. Comunista por sua influência. Depois esse cara virou meu companheiro de lutas. Construímos sua candidatura à deputado estadual com poucos recursos, mas com muito brilho nos olhos, em 2006. E vencemos. Agora venceremos de novo, com muito mais gente, com muitos mais olhos brilhantes. Não dá pra esconder que esse cara mudou minha vida. Esse cara é Marcelo Freixo. Meu voto no domingo é só mais um capítulo dessa história que segue acumulando vitórias rumo ao socialismo, à alegria, à liberdade.
50.123 é Freixo!!!

Chinfrim


Virou-me de ponta a cabeça
Um nome que de trás pra frente
E vice e versa e tanto faz
Faz, desfaz e se refaz na mente.

Trancou-me no peito uma angústia
De esperá-la nunca chegar
De chegar até ela de longe
Sabendo que não chego lá.

Mas lá de distante ela sabe
Que basta se aproximar
Desconcerta toda uma vida
Tropeço, me perco, na certeza de acertar

Faço até esse poema
Chinfrim
Malabarismo, macumba
Pra que a moça saiba sempre
Que eu morro
Eu morro sim
Se ela se esquecer de mim.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Feitiço de Áquila


         
                                                   No solo es luz que cae
                                         sobre el mundo
                                         La que alarga en tu cuerpo
                                         Su nieve sofocada,
                                         Sino que se desprende
                                         De ti la claridad como se fueras
                                         Encendida por dentro
                                         Debajo de tu piel vive la luna.
                                                                          
                                                                Pablo Neruda




Fim dos dias e das horas e do mundo
Bem emaranhados o espaço e o tempo
O ciclo de milanos num segundo
Rompesse num grande e novo intento

E fosse assim um encontro imediato
Diante a mim a síntese completa
Se não glorifico: estúpido e ingrato
O universo inteiro em sua nova meta

As curvas e os contornos e os enleios
Mesmo em sua face oculta um brilho intenso
As nuances e crateras e os dois seios

E a grande novidade mostra nua
Em cada infinidade o corpo imenso
Sintetiza num só astro o Sol e a Lua

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Pernas pro ar ou Tragédia


Duas sensacionais piruetas.
Uma tentativa frustrada.
Nada de rede,
tampouco esperança.
Estatelado.
No chão.
O mais hábil trapezista,
de olhos arregalados,
de alguma forma,
nos deixava uma lição.

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Parto

Fundiram-se os sons num único ruído
Intermitente
Mais surdez, que barulho
A sala clara
(Um clarão)
As cores todas em branco
O recém retirado
Pendurado...
Parecia clamar,
O mesmo ruído agudo e intermitente
De todo o mundo
O tempo transfigurado perdia seu tempo
As cordas de minhas sensações esticadas
Rompiam-se...
E continuavam esticando
O recém retirado passou seu olhar por mim
Pendurado...
Não enxergava.
Vislumbrei cada instante daquele  inspirar
Ofegante...
(só perceberia isso na expiração que veria seguinte)
Antes dela,
Uma moça que nem lembrava
Enfurecidamente apertava-me a mão
Largou-a...
Pareceu-me um carinho.
O era (saberia mais tarde)
Toda aquela eternidade antes de expirar
Nos sufocaria
E pelas caras
Um a um sabíamos disso.
Num soco.
Expiramos...
Rompeu-se o umbigo
Cor a cor
Ruído a ruído
Tudo tornou ao que seria
E jamais experimentei
Coisa tão louca.




quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Mal me quer mal me quer



Hoje chegou um Bouquet.
Doze rosas.
Lindas flores.
Passando por cima do amor,
pisando nas minhas dores.

Quem dera viessem limpas
daquele erro passado.
Ervas daninhas pra mim.
Comprando os meus maus-bocados.

Arranquei pétala a pétala
Mal me quer, mal me quer.
Jurei meu ódio por ele,
Me refiz,
As desfazendo.

Os talos descabelados
dei ao florista que veio
e foi levando um recado:

Paste-as!

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Esgrima ou poema pra ganhar beijo de moça



Golpeio o poema de morte.
Esgrimo contra meus versos.
Duelo.
Pra dar um poema pra ela.

Que do alto da sacada,
agita-me um lenço branco.
Sorri inalcançável,
Enquanto eu não mato o poema.

Linda é a moça do lenço.
Tão linda que até merece
que eu crave na minha poesia
minha adaga, meu reverso.

Ah, mas se a moça soubesse,
que o brilho que ela produz,
alto brilho da sacada,
complica toda minha vida.

Ao mesmo tempo,
que dá ânimo a espada,
Me faz criar outro verso.
Que eu mato logo,
mas na morte perseguida,
recria-se o meu poema.

E nessa luta sem fim,
aos olhos da tal donzela,
eu mato e recrio o poema.
E de novo.
E até o fim.
Só pra provar para a moça
Que eu mereço um beijo dela.

... ou não me amando


Afasta-se de mim um que era outro
E volto a me tornar um ser deixado
Ao largo de um mim mesmo que não encontro
Saída, solução, ciência ou afago.

E vivo e me transijo em meio ao dúbio
Questão pra quem se viu medíocre inato
Torpor, torpor, torpor, nenhum alívio
Um eu fiel ovelha, um outro ingrato.

E o triste é olhar-me assim na estrofe acima
Impresso em menos dor e mais lamúria
Metade de mim sofre e a outra rima.

Seguindo o próprio rastro eu não iria
Achar caminho ou verso em que dirima
Se ela inda me bem ou mal queria.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Cinismo


Caiu sobre mim um cinismo, moça
De virar meus olhos pra ti
De querer sentar ao teu lado
Simplesmente
E num silêncio
Longo
Ao teu lado
Dizer-lhe as coisas mais sérias
Que se eu dissesse em palavras
Saía correndo de mim.

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Dia Internacional da Coincidência




No dia Internacional da Coincidência
Coincidi de te encontrar
Fiz a maior presepada
Valorizando o ocorrido
Falei de mim, do passado,
De coisa alguma
Silêncio...
Já nem lembro.

De nada adiantou,
O filme correu até o meu ponto
Saltei...
Não disse o essencial.
Não te menti tudo que eu tinha
E não pude te encantar
Não prometi nada
Nadinha. (Veja só)
Incapaz de falsear
Da maneira mais sincera
Um mundinho pra nós dois.

Agora presta atenção:
Posso te dar alegria
Ou tristeza
O que você preferir
Eu te darei o contrário
E quando de saco cheio
De eu te enganar por bobagem
Achar que virá alegria
Eu nem te ligarei.

Peço-te em casamento
Largo tudo
Mulher, filho, Faculdade
Mudo para outro canto
E não faço nada disso.
Sexo da melhor qualidade
Cafuné
Compreensão
E Mentira
Mas só da melhor qualidade.

Da maneira mais sincera
Peço para acreditar
Mais nada.
Só isso.
O melhor de mim será seu
De graça.
“A mentira pode ser melhor que qualquer concretude”
As mais belas realidades
Eu mentirei pra você
Também mentirei as mais feias
Sendo o mais sincero possível.

Invento um dia pra nós
Feriado Nacional
Se quiser todo dia eu invento
Um calendário para ti
E até te deixarei
Três dias pro seu namorado.

Nada de dúvidas, insegurança
Sempre mentirei pra você
(pode confiar)
E isso será tão verdade
Quanto todo este poema
Que não veio do vazio
Veio da Saudade
Da tristeza
De mim, veio o poema
Da minha infeliz alegria
Da vontade de te amar
De inventar uma paixão
E intregar-me a mim e a ela
Inventei pra ti um poema
Que é a mais pura verdade.

domingo, 19 de setembro de 2010

Laísla



À Federico Garcia Lorca

Laís,
la isla donde las lunas verdes murren
en lagunas oscuras.

quinta-feira, 16 de setembro de 2010

Sentença de verdade contra mim


JULGO PROCEDENTE A DENÚNCIA PARA CONDENAR CARLOS ALBERTO LUCIO BITTENCOURT FILHO E RAPHAEL RODRIGUES DOS REIS, COMO INCURSOS NAS SANCÕES DO ARTIGO 65, PARÁGRAFO ÚNICO, DA LEI 9.605/98. PASSO A FIXACAO DA PENA.
OS ACUSADOS SAO PRIMÁRIOS E DE BONS ANTECEDENTES, MENORES DE VINTE E HUM ANOS A ÉPOCA DO FATO. PELA COMPLETA DESPREOCUPACÃO COM O CUMPRIMENTO DO "SURSIS" PROCESSUAL, PERCEBE-SE QUE A CONDENACÃO EM NADA IRÁ INCOMODÁ-LOS OU CAUSAR ARREPENDIMENTO, MAS TRARÁ O GALARDÃO DE SEREM PUNIDOS PELO ESTADO "BURGUÊS E REPRESSOR". COM CERTEZA SENTIRAO MAIS CONFORTO DO QUE PREOCUPACAO. "A CULPA É DOS OUTROS!". "O CÁRCERE É A PRIMEIRA ESCOLA DO REVOLUCIONÁRIO". JARGÕES QUE ACOMPANHARÃO OS ACUSADOS COMO MEDALHAS POR SEUS PROCEDIMENTOS.
ASSIM SENDO, FIXO A PENA BASE ACIMA DO MÍNIMO LEGAL, MESMO PORQUE, DO PONTO DE VISTA IDEOLÓGICO, A REPRIMENDA DEIXARÁ DE TER EFEITO PEDAGÓGICO OU RECUPERATÓRIO.
A SENTENÇA, TODAVIA, NAO PODE FICAR INCOMPLETA. NO MAIS, O MONUMENTO ATACADO ESTÁ SITUADO NO CENTRO DA CIDADE, EM LOCAL DE GRANDE MOVIMENTO. FIXO A PENA BASE EM SETE MESES DE DETENÇÃO, PARA CADA ACUSADO, PENA ESTA QUE TORNO DEFINITIVA, À FALTA DE OUTRAS ATENUANTES. A PENA DE PRESTACAO DE SERVICOS JÁ SE VIU INADEQUADA. NÃO CUMPRIRAM NO REGIME DO "SURSIS PROCESSUAL". IMPOR PENA PRISIONAL SERIA EXTREMAMENTE DELETÉRIO. IMAGINE OS EFEITOS PREJUDICIAIS QUE OS ACUSADOS CAUSARIAM EM UMA PRISÃO, SOBRE A PERSONALIDADE DE INGÊNUOS ASSALTANTES, SEQUESTRADORES, TRAFICANTES E HOMICIDAS, QUE AINDA PODEM SE RECUPERAR.DAI PORQUE SÓ VEJO COMO OPORTUNA A LIMITACÃO DE FINAL DE SEMANA. ALIÁS, É BEM POSSÍVEL QUE, AO SEREM SUBMETIDOS A PALESTRAS, OS ACUSADOS VENHAM A ENCONTRAR CONFERENCISTAS DA MESMA LINHA IDEOLÓGICA, OU QUANDO EM ATIVIDADES EDUCATIVAS VENHAM A DESENVOLVER DOTES PICTÓRIOS MODERNOS, EM CAMISETAS. SUBSTITUO A PENA PRIVATIVA DE LIBERDADE, FORMA DOS ARTIGOS 43, INCISO VI, C/C ARTIGO 44, INCISOS I, II E III, TODOS DO CÓDIGO PENAL, IMPONDO A PENA RESTRITIVA DE DIREITO DE LIMITACAO DE FINAL DE SEMANA, PERMANECENDO OS ACUSADOS, EM CASA DE ALBERGADOS POR CINCO HORAS DIARIAS. CONDENO CADA ACUSADO A MULTA DE DEZ DIAS-MULTA. FIXO O VALOR DO DIA-MULTA EM 1/5 (UM QUINTO) DO SALARIO MÍNIMO VIGENTE À ÉPOCA DO FATO. CONDENO OS ACUSADOS AS CUSTAS PROPORCIONAIS. TRANSITADO EM JULGADO, LANCE-SE O NOME DOS ACUSADOS NO ROL DOS CULPADOS E EXPEÇA-SE CARTA. FIXO, DESDE LOGO, O REGIME ABERTO, PARA A HIPÓTESE DE REVOGACAO DO BENEFÍCIO CONCEDIDO. CIENTE O MINISTERIO PUBLICO E A DEFENSORIA PUBLICA.INTIMEM-SE OS ACUSADOS PESSOALMENTE. P.R.I. RIO DE JANEIRO, 14 DE MAIO DE 2004.

Pássaros azuis


Quando suas mãos pegam fogo,
Não adianta levantá-las para o céu,
Pois os pássaros azuis irresponsavelmente sobrevoarão seus pesadelos.

Se, pegam fogo as mãos –
já sentiram-se assim? –
Torna-se impossível limpar uma lágrima
ou tocar o coração de alguém,
sem que os pássaros azuis arrevoem os maus presságios.

Quando pegam fogo as mãos,
os gestos mais delicados,
deitar a mão sobre uma flor de um jardim,
de uma mulher,
podem contagiar de revoada irresponsável,
de rasantes,
e fúria.

Quando suas mãos pegam fogo...
Gire-as, bata-as vertiginosamente.
Espantalhe os pássaros,
duele à morte com os inimigos,
imponha-se aos maiores riscos,
ao perigo de renascer,
sob novos ventos.

quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Façanha


As realizações
cabem ao prefeito.

Ao poeta,
as façanhas.

Quando Manoel de Barros irrealiza uma pedra,
e Rimbaud vai traficar armas na África,
ou Pessoa confessa em linha reta seus vexames.

Quando Vinícius alcovita a morte,
e Maiakovski se mata.

Quando Bandeira se enamora de um porquinho-da-índia,
e Drummond desdenha a Máquina do Mundo que a ele se abriu,

Não estamos diante de outra coisa.

As realizações são pra prefeitos.

Here comes the sun


Lá vem o sol.
Pela fresta ele sussurra pra minha escuridão,
sem despertá-la,
ele me chama pra outro dia.

Lá vem o sol.
Veio iluminar seus olhos e pensamentos
e torná-los céu azul e maré,
mnha flor delicada.

Lá vem o sol.
Ele iluminou a folha desse poema,
Que resistirá à nuvens e trovoadas,
aos maus tempos que virão,
minha delicada flor.

Transporte Público


Dois poemas de caminho,
em pé no ônibus cheio,
perderam-se.
Sem anotação.

Quantos desses todos os dias,
por fruto da lotação,
não perdem-se em descaminhos.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Proparóxitonos ou sobre esdrúxulos


Vamos laurear os éticos,
Os cáusticos,
Os cínicos, os córsegos,
Os cônegos, réprobos,
Os mórbidos, os fáticos
Os rênitos e os rásteros
Os plásticos e os fúnebres,
Os Mônticos e os líricos
Sobretudo os cáusticos e os líricos
No Zênit caótico.

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

sexta-feira, 3 de setembro de 2010

Adeus. memória, tempo



E se o tempo estanca?
E se os olhos mudos permanecem assim,
em adeus?

E se as vontades de querer ficar-partir,
fossem vistas,
em foto,
instantâneas e pra sempre?

E se os olhos permanecem assim,
Olhando?
A vida parada com o tempo.
E se?

quarta-feira, 1 de setembro de 2010

Catarse


Catarse,
aprendizado pelo espanto;
susto com asas.
Liga de encanto e desencanto;
Riso em pranto.

segunda-feira, 30 de agosto de 2010

À maneira de minérios



Há minas de estanho
Há minas de bauxita
Há minas de carvão.
Os Andes, em se cavando,
Tudo dão.

E à maneira de minérios,
há mineiros.
Subsólicos, subaltérnicos.
Estranhos de estanho.

À maneira de minérios
Sedimentarão,
Sozinhos
Meses, dois meses
Metáfora real da solidão.

quarta-feira, 4 de agosto de 2010

Mundo abaixo


seja como for
vamu botar o mundo abaixo.
Seja com suspiro
seja com terror
Vamu botar o mundo abaixo.

Seja como seja
seja como for
seja com porrada
seja com amor

Vamu botar o mundo abaixo
seja como for.

terça-feira, 29 de junho de 2010

Lição




Do medo do audaz.

Do silêncio
do que tem a dizer e cala.

Do orgulho
daquele que mantém-se contrito na humildade.

Do decoro
que há no ritual do orgasmo.

No amor próprio
do mártir.

Na pureza do devasso.

Na transparência do tolo.

Há sempre uma lição

Quase lição


Do desespero de quem procura
e não achará.

Da alegria forçada
de quem será pra sempre triste.

Das muitas paixões
do incapaz de amor.

Da fêmea que geme e gane e contorce
e não goza.

Das bravatas do covarde.

Quase se tira alguma lição.

domingo, 27 de junho de 2010

Proposta de método para criar histórias coletivas


Plano para Deus e o Diabo carioca
Cangaço na Favela
Ou
Proposta de método para criar histórias coletivas

Pai – morto –poder – filho – vingança/ganância/coragem –reparação –sacrifício.

O cara tava segurando uma furadeira, em situação banal, chega a polícia e passa fogo. Mãe, filho, assistem. O pai era um cara maneiro, ia plantar uma flor. Subiam à laje, após um momento de encontro, na verdadeira acepção da palavra. Quem não daria o tiro? Quem daria? E por que não pode voltar bala? As leis do direito de vingança e justiça. A luta, coletiva. “Um homem roubado nunca se engana”. Sem heróis, mas com mártires que não nasceram pra morrer. Nenhum que já existiu, mas que pode estar em processo. Pode-se, inclusive, ser apenas um sonho no final. Um sonho pós-morte. Perigoso.

Daí em diante, não sei fazer sozinho. Depois é decifrar essa história em debates. Transformá-la em roteiro. Pirar nas filmagens, na edição e botá pra frente.

Triste como um cão.
Silêncio então.

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Predestinado


E como se o vazio que me espreita,
desde sempre,
me agasalhasse por completo.
Nessa manhã,
como se eu acabasse finalmente,
pro mundo em torno.

E a tristeza,
mãe de todos os meus filhos –
exceto um –
deitasse sobre mim,
nua.
E me desnudasse.

E o sentimento do erro,
confrontado ao erro mesmo.
De tudo pra trás e pra frente, pro fundo,
matasse de vez meus acertos,
meus sonhos
todo o futuro e até as lamúrias.

E a morte
que sadicamente só me conduzirá mais tarde,
no ocaso do corpo,
me acompanhasse com suspiros e enleios.
Em sopros de uma vida escura
Em lágrimas que não caem
Em amores que escorrem e não vingam.

E finalmente,
Compreendi.
Nessa manhã.
Minha predestinação.

quarta-feira, 2 de junho de 2010

Exercício Crime e Castigo


Da multidão passante, em ir e vir, caótica. Das pessoas todas, era simples distinguir Roulién Cordas. Cortava entre as gentes com ar displicente e febril e de quando em quando mais arfava que dizia: – Raskólnikov. Embrenhava-se em pensamentos, embaçava os olhos pra dentro, indo a diante e sem se dar: – Raskólnikov, repetia e repetia. E eu que o narrava, já o destacando dos demais, perscrutei a moça que vibrava nele e o pensamento fixo que o seguia: “pode-se passar impune ao crime, mas não à paixão”.
Numa mentação furiosa, obstinada, Roulién havia sido predestinado de mulher. Aquela coincidência, que para um realista pareceria trivial, tomou um sentido sobrenatural, místico. Como quando Raskólnikov ouvindo dois homens suporem a morte de uma velha usurária com quem ele acabara de empenhar uma jóia, entende essa coincidência como um chamado. Então à coincidência mística, somou-se a compreensão mística que ele tinha de Crime e Castigo. E Roulién Cordas siderou. E tornou-se personagem.

Romance nenhum


Porque o poeta não faz um romance?
E me lembrar que não sou nem o primeiro.
Seguirei mil, dois mil
dois parágrafos começados rumo ao romance nenhum.

Porque o poeta não faz um romance?
Como ligar esse halo com as personagens em detalhe?
Mostre-me uns versos Dostoeiévski!
Mostre maldito russo! Inatingível russo!

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Música




I
Entortada,
Uma melodia vira suco.
Ou melancolia.

II
As notas musicais,
de passo e passo, meio passo
passo, passo, passo, meio
Se encaixam em mistério.

III
Como música,
soará meu poema.
Renuncilenciará.
Mas como a corda, como o sino
que vibrou e ainda vibra;
Resoará.
Acolhido.
No ventre do seu ouvido.