quarta-feira, 2 de junho de 2010

Exercício Crime e Castigo


Da multidão passante, em ir e vir, caótica. Das pessoas todas, era simples distinguir Roulién Cordas. Cortava entre as gentes com ar displicente e febril e de quando em quando mais arfava que dizia: – Raskólnikov. Embrenhava-se em pensamentos, embaçava os olhos pra dentro, indo a diante e sem se dar: – Raskólnikov, repetia e repetia. E eu que o narrava, já o destacando dos demais, perscrutei a moça que vibrava nele e o pensamento fixo que o seguia: “pode-se passar impune ao crime, mas não à paixão”.
Numa mentação furiosa, obstinada, Roulién havia sido predestinado de mulher. Aquela coincidência, que para um realista pareceria trivial, tomou um sentido sobrenatural, místico. Como quando Raskólnikov ouvindo dois homens suporem a morte de uma velha usurária com quem ele acabara de empenhar uma jóia, entende essa coincidência como um chamado. Então à coincidência mística, somou-se a compreensão mística que ele tinha de Crime e Castigo. E Roulién Cordas siderou. E tornou-se personagem.

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