terça-feira, 24 de julho de 2012

Construção Coletiva

De que valeriam nossas mãos
senão dadas?
De que valeríamos?
O quanto se poderia?

Mas em farra nossas mãos se deram.
Sob sol e sorrisos demos as mãos em ciranda.

E quem poderá deter nossas mãos dadas?
Mãos dadas amedrontam medo
afugentam até os tanques.

Mãos dadas orientam horizontes.
Não soltemos as mãos!

segunda-feira, 22 de agosto de 2011

Triunfo



Num deslocameto súbito
rolaram pedras e lágrimas
e instintos nebulosos e violentos assomaram-se
a um armegedon fulgurado nos olhos fulgurantes.
Dos sorrisos uivaram dor.
Feneceram, então, as últimas esperanças
sepultou-se as mãos dadas,
podadas as floradas na raiz,
jaziam já murchas e contritas suas cores.

A plateia
em seu gosto sádico pelo trágico
convalescia em risos secretos.
Como que se continuasse o trabalho do equívoco
como se fosse as suas consequências mesmas
em orgia
em glória
em vingança.

Mas na luta impiedosa
onde sangue e rícino e bili
eram sorvidos com gosto.
Do convívio tão intenso e íntimo com a vergonha
surgiram as sem vergonhas trocas de carinho.
Como da escassez um cacto,
como o ato canibal de um náufrago.
Ressurgiu um amor enodeado e visceral.
Um desespero, um grito
Uma paixão labiríntica e turbulenta
Um pesadelo.

Um amor, no entanto.
Nada teatral-farsesco,
shakesperiano.
Um amor camelo, cacto,
Brutal.
Com as unhas gastas e as pontas dos dedos em carnevivas
De dias de escavação sem pá e sem auxílio
Em bruscas paredes que diária e subtamente soerguiam-se do nada em seu caminho.
Amor bravura, amor fatal.

E em catarse
Esse amor em riste e frágil
Tolo e bravo
Enodeado por completo e puro
Que de tão envergonhado expõe-se nu
Estoura!
E enlameia tudo em volta de amor
Escarnecendo, imundando
os limpos e bem comportados
os certos e intrôpegos,
as normas e os normais
e os otários.

E num rasgado de um trompete marcial
um hino fúnebre de vida anuncia:
há surgido o amor eterno.
Ajoelhem-se diante do único e possível amor verdadeiro!
Ele triunfou!

terça-feira, 9 de agosto de 2011

Fumaça

                                                    à memória de Daniel do Vale

Como nunca eu sempre fiz

num te reconfortarei de coitado.

Ah, irmão meu...


Ouvi, as últimas palavras que déste...

ainda me soaram sem nenhuma coitadisse.

Ainda pareceu aquela esgrima ancestral

que sempre nos levou além.


Há muitos vivos muito mortos de explicação.

Suas vidinhas não suportam um suicida...

o suicídio pra vidas miseráveis, é incabível.

Soaria não como um gran finale

Mas como uma confissão.


Ah meu irmão...

fostes grande diante do infinito e do eterno.

Nessa proporção,

O que são 30, 50, 100 anos a mais?


Não duvido de que se fosse possível (foi?)

Seguiste com um risinho de beira, vaidoso,

no cortejo do seu caixão.

Repleto de amigos e chegados de todo tipo

em reverência desvergonhada.

Em desespero, lágrimas, vômitos...

em amor, em luta!


Uma confissão quase mórbida... mas sob graça:

a última vez que ti vi... foi sob um pano branco

empurrado por uma rampa sem rosto... já longe.

Quando passavas morto sob esse pano não te ergui meu último olhar.

Senti, no entanto, o cheiro.

Ia ficar orgulhoso: o efeito do cravo sistemático através dos tempos

Deu cheiro de vida ao seu cadáver.


Ah, meu irmão...


De fato, cessaste.

Fica clara assim a nossa mesma constituição

da matéria que é feita a fumaça.

E assim, como mesmo a matéria da fumaça,

segue desamparada por aí

a matéria densa dos bons e dos maus momentos:

ações, pensamentos, risos, lágrimas...

desamparada e etereamente seguirão

no misterioso labirinto em rio da memória.

sábado, 23 de julho de 2011

Quando tomba no front um companheiro


                                                                            A Paulo Piramba

A notícia
não vem em telegramas.
Vem num zunido atônito:
um companheiro tombou no front.

Não há qualquer sinal de trégua.
Passam zunindo sobre nossas cabeças rajadas de ameças atrozes
e todas as ciências de endurecer corações seguem em açoite.

Mas há uma mensagem:
um companheiro tombou, um dos nossos.
E os olhos dos que seguem entrincheirados rangeram,
os dentes trincaram.
Então, o mais silencioso dos estrondos revolveu a matéria profunda
dos punhos e dos sonhos.

Um companheiro tombou no front.
Um desejo sereno de vingança correu na saliva dos entrincheirados.
Avançar! Avançar!
Antes que outros olhos se cerrem sem ver.
Avançar! Avançar!
Fazer findar as trincheiras e os inimigos!
E na redenção vitoriosa dos vivos
Redimir nossos mortos.

terça-feira, 19 de julho de 2011

SMS

Há uma moça
que veio caminhando
com passos de silêncio e olhos de sorriso.

Através de um tempo
sem ontem nem amanhã,
assim como a lua em seu destino.


Assim como a lua em seu destino,
raiou um amor em mim.

sexta-feira, 1 de julho de 2011

Uma defesa (quase) científica da utopia



Há de se ter uma parcela de ilusão em nossas vistas?
Curto circuito entre a nossa imensa finitude
E o eterno e o infinito?
Entre o “Isso”[i] e o eu?
Sempre?

Sim.
Há!
Sempre!

A maioria, por exemplo, se ilude
Dedicando-se mais ao trabalho do que ao amor...
Um percentual muito elevado deposita todas as suas ilusões
no mercado futuro da Divina Providência.
E há os plenamente satisfeitos:
os plenamente iludidos.

Sem ilusões,
Teríamos uma humanidade suicida;)

Como lustrar, então, nossas ilusões,
para que brilhem?

Utopia.

As horrendas paranóias
de um Hitler, de um Ford, de um Geisel...
e de outros stálines, híteleres, fórderes, gáiseles...
fazem parte da entropia[ii],
não são utopia.

A utopia tem forma de flor e
cheiro de sereno.
Sempre será abraço, cantiga, cafuné.
Substituamos a ilusão pela utopia!
Utopia ou Barbárie!


[i] Id – Freud.
[ii] Perda de energia; nesse caso histórica-humana. Anti-utopía.

segunda-feira, 27 de junho de 2011

Negro é inspiração (Prêto di Maria)

Ensaio fotográfico da querida Maria Buzanovsky - de criolhos azuis, onde contribuí com um poema. Com a voz não sei se contribuí...

quinta-feira, 19 de maio de 2011

Poema Concreto

                                                                         Aos concretistas...

Não há maior,
mais poética declaração de amor
a uma mulher
do que roubá-la do marido.

segunda-feira, 16 de maio de 2011

Compota


Com seus mels,
Contornos,
Entrâncias e reentrâncias,
Peles, carnes... dorso.
Explosões de riso, ciúmes, prazer...

Faço uma compota de você.

quarta-feira, 13 de abril de 2011

Prêto di Maria

                       Aos prêtos olhos azuis di Maria                    
 
A câmara escura,
trás as lentes azuis de olhos Maria,
revela o prêto.

Como se cruzasse, de novo,
um misterioso Atlântico,
o prêto,
chega antigo e futuroso
retido nas lente-retina di Maria.

E é luz que reluz
do prêto que nunca é escuro.
Da melanina
de película onde se retiveram histórias
açoites, suores
abraços e batuques.

Vêem-se,
nos criolhos azuis de Maria,
almas cólor-incolores
Dores e amores,
Saudades,
ressoarem segredos.

E lua após lua,
em ginga de tambores.
Num furdunço de horizontes e Orixás.
Maria trocou olhares
(fez a muda).
Trocou olhos por alma.
Azul por prêto...
Empreteceu. Denegriu.

Repercutiram, então, catástrofes.
Misérias cravadas em cicatriz,
noites mal dormidas,
galeras, canhões
refletiram nos prêtos olhos azuis di Maria...

Que chorou fotografia.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Psicografando Castro Alves no dia de seu nascimento ou Brincadeira

Chuva incógnita que desce do além,
que estropia o passo que eu lançava adiante.
Mas que é doce, mansa e serena e vem
Beijar-me a galope, inda ofegante.

Sob escombros de dilemas ancestrais,
porcelana d’um riso aberto e oculto.
Casa abandonada, olhos de vitrais,
joelhos feridos de tropeço e insulto.

Quimera de tristeza e gargalhada.
Um canto de mil anos vem no vento,
torna nossa mão esgrima estabanada.

Faz dos nossos males de fel, ungüento.
Jorra sonhos em sangria desatada.
Será que essa explosão no peito agüento?

domingo, 13 de março de 2011

Invocação

Um meu aluno no refeitório:
- Professor, sou invocado com eletricidade. Tenho invocação para eletricista.

Invocado pra poesia esse emigrante do Maranhão.

Invocou uma ideia-palavra nova.
Misturou dom e súplica e obstinação.

quinta-feira, 10 de março de 2011

Lugar incomum

Ocupar os lugares comum
Entorná-los comum.
Incomudá-los.
Mundar os lugarescomum
Excomungá-los.

Que a palavra “crítica”
Volte a ser raio e trovão.
E a palavra “amor”
Silêncio.

Fortuna, riqueza, valor
Imprescindíveis palavras
Dispam-se de toda usurpação e pobreza.

Que abraço seja abraço,
perdão perdão
miséria miséria.

Que a palavra relativo
Volte a ser transitiva indireta
Não absoluta.

Que nunca se perca o rebolado sacana
Ou a cor amarga e cêca que tém todas as palavras
Como o furdunço ou a morte.

Mancomunemos-nos lugarescomum.